domingo, 4 de novembro de 2001

Em tornos do amanhecer

Estou em meu quarto, esperando que o frio que congela os dedos dos meus pés, pare. Na verdade, este é o mesmo frio que mantém o meu charuto vagabundo aceso por mais tempo. Passei a noite inteira esperando as mensagens chegassem, mas nenhum dos meus amigos que mais prezo estão por perto para dizer algo. Meu quarto defumado pelo charuto, ainda é um conforto para a vontade de pensar e agir em cima do teclado, mas sua cor amarelo-indiferente não me ajuda a pensar em nada, a nada escrivinhar. Somente digio, digito e digito, sem ao menos pensar no que tô escrevendo, e este momento, eu realmente estou escrevendo, e não escrivinhando. Preciso pensar em algo.

Soube a pouco tempo que posso me tornar marqueteiro. Não ficar somente dependendo desta vida de professor que tenho, mas que posso mexer ainda mais com o mundo das palavras e das vendas. Isso me alegra, pois trabalhar com isso é um sonho distante que parece querer me encontrar de novo. Mas por que tanto tempo de espera? Talvez, só Papai do céu saiba e nada posso discutir com ele. E nem quero.

Passei muito tempo sonhando demais, achando que não podia ser o que eu tinha vontade. É isso que dá ficar rodeado de pessoas que sabem bem o que gostam de fazer, que não têm pudor de mostrar que são bons. Sempre fui meu contra o elo total a seu ego, mas tenho que respeitar aqueles que sabem bem usar. É hora de crescer.

Tomo remédios para tentar dormir, mas o charuto me deu barato. Deitado numa cama de casal que sobrou da viagem de meus pais, eu rolo, viro e desviro sem ao menos ser nocauteado pela programação chata do horário dos insones. Quer porra. O charuto entorpeceu a minha língua com um gosto amarelo de nicotina que só tinha percebido pelo hálito de meus pais. Que depois de tantos anos fumando esta coisa perto de mim me deixou flácido por esta porra. Nem mesmo a garrafa de whisky Balantines que estava dormindo na adega de meu pai pode me fazer dormir ao ponto que quero. Não consegui pregar os olhos o dia inteiro. Talvez eu devcesse ser mais exdrúxulo e pegar o martelo e os pregos.

Não, depois como eu farei para ler, para escrivinhar e ler as entrelinhas de uma propaganda? Minha professora, a porra-loca, lá da faculdade disse que tenho tudo a ver com marketing, que as análises de propaganda que fiz lá na Faculdade de Formação de Professores foram realmente ótimas, e que os meus amigos, os mais íntimos mesmo, disseram que a análise fora expetacular e que eu realmente devesse seguir esta linha.

Estou fazendo um elo ao meu ego, mas eu preciso dele agora, para me sustentar. Viro, deito e desdurmo. Sem ao menos o sonho que preciso me nocauteie as retinas e me faça dormir um pouco que seja.

- Senhor... - levanto a mão para chamar o cara de branco e de pano na mão.
Que merda. Fiquei flácido por esta merda.

Ótimo, ótimo. Estou fumando, charuto, estou com frio e com vontade de escrivinhar. Estou com vontade de ser, de crescer.

Ainda lembro das palavras de minha amiga Beatriz, Blended in our turmoil, turn oil, disaster of living, life is horror, babe, love is deep inside the brume in your eyes, que mandou uma carta há pouco tempo para mim, dizendo que despedira-se do mundo do trabalho, para curtir o resto do mundo de adolescente. Caralho, eu ainda não sei bem o que quero para mim. Sou uma artéria desajustada do seu fluxo, que bombeia sangue venoso para as entranhas do batedor e o envenena com gás que carboniza sua voracidade, que carboniza seu sentimento, que carboniza o próprio alimento.

- Por favor, senhor, duas doses de whisky on the rocks.

Hora de acordar, senhor. Penso

- Hora de acordar, senhor. Tem alguém te esperando na porta.

É a minha mulher no bar. Bem ali na porta, ela e sua cara de desarcordo com as minhas ações. Me desculpe, Raquel.

Deixo uma nota marrom em cima da mesa molhada, pego o meu casaco e fecho os olhos, cortando a luz do Sol, que se tampou atrás de nuvens nervosas, ou choradeiras, e que na verdade, só me fazem querer despertar.

Fecho os olhos com mais intensidade, e transpasso a neblina, querendo saber-me


(Beatriz, foi esse pensamento que me fez escrever o meu último email, espero que saiba e que me faça as críticas que são necessárias.)

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